Até o aparecimento bem recente do Youtube, que permitiu que muitas pessoas registrassem em vídeo as suas experiências e estratégias para o aprendizado de línguas, era muito raro encontrarmos textos de poliglotas contando como faziam para aprender tantos idiomas. Este assunto me fascina, pois o que pude constatar é que muitos dos poliglotas que conheci por meio do Youtube compartilham uma metodologia que possui muitos pontos em comum.

A Dra. Kató Lomb (1909 – 2003) é a autora do livro How I learn languages. O primeiro fato importante, e que desmonta um dos mitos mais difundidos quanto ao aprendizado de idiomas, é que os mais velhos não conseguem aprender idiomas tão facilmente. A Dra. Lomb começou a estudar inglês com 30 anos, visando obter uma posição como professora. Ela aprendeu russo já com 37 anos, e chegou a dominar 20 idiomas. Estudou línguas praticamente até o final de sua longa vida. Ela foi a primeira tradutora simultânea do mundo.

Reproduzo a seguir algumas das recomendações da Dra. Kató Lomb, registradas em seu livro:

Leitura

Os livros da Dra. Lomb retratavam as estratégias de sucesso adotadas por muitas pessoas no aprendizado de idiomas, inclusive as suas próprias. Uma de suas estratégias de sucesso consistia na leitura de livros ao iniciar o estudo de um idioma. Ela sugere que a leitura intensiva deve ser usada desde o começo do aprendizado.

Ela afirma ainda que a maior parte do conhecimento de um estudante não virá de dicionários, livros didáticos ou professores, mas dos livros. Em alguns trechos de seu livro ela relata suas experiências no aprendizado de inglês, russo e espanhol através de romances. Este é um fato em grande parte ignorado por pesquisadores do ensino de línguas.

Gramática

A Dra. Lomb também desbanca o estudo da gramática como algo essencial. Ela afirma que o modo tradicional de estudar idiomas, aprendendo 20 ou 30 palavras por dia e digerindo a gramática fornecida por um professor ou um livro didático, pode satisfazer apenas o senso de dever, mas dificilmente será uma fonte de prazer. Citando os autores Toussaint e Langenscheidt: “Uma pessoa aprende a gramática através da língua, mas não aprende a língua através da gramática” (1).

Livros didáticos

Outro ponto controverso (mas verdadeiro), ela afirma que os livros didáticos devem ser criados não por quem fala o idioma alvo, mas sim por pessoas do país onde o idioma estrangeiro será ensinado. Um estudante brasileiro deve estudar em livros escritos por brasileiros. Segundo ela, cada nação possui suas próprias dificuldades específicas ao aprender um idioma estrangeiro e ninguém melhor do que nativos do idioma local para entender isto.

Imersão no idioma

A Dra Lomb diz também: “Um idioma estrangeiro é um castelo. É recomendável que ele seja cercado em todas as direções: jornais, rádio, filmes que não sejam dublados, artigos técnicos ou científicos, livros didáticos e o visitante que está na casa de seu vizinho”(2) Em outras palavras, devemos aproveitar todas as oportunidades que aparecerem na nossa frente para praticar o idioma que queremos aprender.

Sucesso no aprendizado

O sucesso no aprendizado é primariamente determinado por motivação, perseverança e diligência e não por uma habilidade inata (3).

Este é um outro mito que atrapalha em muito o aprendizado, muitas pessoas pensam que não aprendem um idioma por não terem capacidade para tal. A maioria dos poliglotas que estudei afirmam exatamente isto, se tivermos motivação, perseverança e nos divertirmos com o aprendizado, não tem como não aprender.

Cursos tradicionais

Segundo a Dra. Lomb, cursos tradicionais de idiomas possuem uma vantagem: a confiabilidade da informação linguística e a regularidade das aulas. A desvantagem: inconveniência, ritmo frequentemente lento, e menos oportunidades para aprendizagem seletiva. Ao final, o método clássico, centrado no professor, tem seu próprio mistério. A questão é como suplementá-lo com métodos pessoais?

Dedicação

A Dra. Lomb reconhece que o aprendizado de um idioma requer tempo. Nós devemos aproveitar toda e qualquer oportunidade, seja no trabalho ou no lazer, para praticar o idioma. Ela recomenda praticar todos os dias. Se o tempo for curto, tente fazer um monólogo de dez minutos.

Estas recomendações podem parecer simples ou óbvias, mas são raros os programas acadêmicos de aprendizado de idiomas que as incorporam.

Conclusão

Como já havia dito, muitas destas recomendações são espelhadas nos depoimentos de muitos poliglotas. Muitos destes depoimentos já foram relatados nos artigos publicados neste site. São estratégias simples e se forem adotadas certamente renderão ótimos resultados.

Os mitos quanto ao aprendizado de idiomas são também um grande impedimento ao aprendizado e são difíceis de serem vencidos, mas tudo é possível quando se quer algo com intensidade.

Este artigo é uma visão bem simplificada das recomendações da Dra. Lomb, mas em essência é isto mesmo. Muitas destas recomendações já foram abordadas em artigos publicados no portal Aprendendo Inglês.

A versão em inglês do livro da Dra. Kató Lomb tem 217 páginas e está disponível para download.

Notas

(1) One learns grammar from language, not language from grammar.

(2) A foreign language is a castle. It is advisable to besiege it from all directions: newspapers, radio, motion pictures which are not dubbed, technical or scientific papers, textbooks, and the visitor at your neighbor’s.

(3) I want to demystify language learning, and to remove the heroic status associated with learning another language.

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