Por que o “difícil” é uma ilusão.

Por Rubens Queiroz de Almeida

A palavra “difícil” traz consigo uma conotação extremamente negativa. Como significados agregados pensamos em fracasso, incapacidade, incompetência, e por aí vai.

Eu evito sempre que possível usar esta palavra. Por exemplo, em minhas aulas de leitura em inglês, eu sempre digo que não existe texto fácil ou difícil, apenas textos para os quais já estamos preparados e outros que vão nos exigir um pouco mais de estudo.

Certa ocasião, em uma aula de leitura, apresentei aos alunos um texto sobre informática, que eu achava fascinante. O texto fazia diversas especulações sobre o nosso futuro e como a tecnologia da informação iria moldar este futuro. O texto foi um fracasso completo. Todos reclamaram que era muito complexo, pouco interessante. Um verdadeiro desastre.

Já em outra aula, o texto tratava da história do futebol no Brasil, como surgiu, como chegou até nós, as nossas conquistas no futebol. A receptividade para este texto foi totalmente diferente daquela recebida pelo texto de informática. Em termos de complexidade eu diria que os dois se equivaliam. O grande diferencial foi a informação prévia sobre o assunto que os alunos possuíam. De informática não sabiam quase nada, já de futebol …

Rotular algo de difícil, principalmente no ensino de idiomas, é algo que mina a auto-estima. Vejam os exemplos acima. Os dois textos, à exceção de alguns termos específicos à área de futebol e informática, possuiam uma complexidade semelhante. A diferença é que a quantidade de informação que possuímos antes de ler o material é um fator determinante para sua melhor compreensão. Ao selecionar o texto sobre informática não levei em conta que os alunos não possuíam a mesma familiaridade e interesse sobre o assunto que eu. O texto era ótimo mas, ao que parece, só para mim. Dificilmente alguém pensará que este é o problema. Pensará que não entende de inglês, que não consegue aprender, etc.

O que eu quero dizer é que não há nada fácil ou difícil. Existem coisas para as quais estamos preparados e outras para as quais precisamos investir um pouco mais de tempo. Fazer um julgamento sobre a competência ou falta dela para resolver determinado problema baseando-nos apenas em um primeiro contato é algo totalmente equivocado.

A nossa capacidade de reter conhecimentos é tanto maior quanto maior for o nosso conhecimento do mundo. Toda informação nova que recebemos precisa fazer sentido para nós. Não somos computadores, que armazenam informações desconexas, que não se relacionam com nada. Uma técnica comum de memorização de nomes consiste em associar as feições ou alguma característica peculiar da pessoa a que somos apresentados a algo que faça sentido para nós. Desta forma uma informação leva a outra. Associamos o novo, a pessoa que conhecemos, com algo que faça sentido para nós.

Para desenvolver a habilidade de leitura em inglês é importante que a pessoa leia bastante em seu idioma natal. Esta afirmação, quando feita em sala de aula, sempre suscita uma grande dose de curiosidade e suspeita. Como podemos melhorar a habilidade de leitura em um idioma lendo em outro?

Na verdade, ao ler, estamos apenas aumentando o nosso conhecimento do mundo, criando novos referenciais onde informações novas podem se encaixar.

Na escola os professores nos ensinam que devemos ler um texto no mínimo duas vezes: a primeira vez para obter uma impressão geral e a segunda vez para obter uma visão mais aprofundada. Na verdade o que ocorre é que, quando lemos o texto pela primeira vez, grande parte das informações que possuimos subconscientemente sobre o assunto são trazidas à tona. Por isto que a segunda leitura é bem mais fácil que a primeira.

Na verdade não lemos com os olhos e sim com o cérebro. Mesmo que uma palavra esteja incorreta, frequentemente não notamos o erro. Se encontramos a palavra “Naboleão“, dificilmente notaremos a troca das letras. Estudos demonstram que, se em nossa leitura, identificassemos primeiro a forma das letras, para depois formar as palavras e em seguida as sentenças, não conseguiriamos ler mais do que 60 palavras por minuto. A taxa média de leitura é de 150 palavras por minuto, e existem pessoas que conseguem ler muito mais rápido empregando técnicas de leitura dinâmica.

Na verdade o que ocorre é que nosso cérebro, a partir de algumas informações visuais, fornece o restante do contexto. Desta forma podemos ver que o nosso conhecimento prévio de determinado assunto pode contribuir para que absorvamos a informação com maior velocidade e facilidade.

Embora eu tenha empregado um exemplo tirado de minha experiência como professor de idiomas, esta abordagem do que é fácil ou difícil pode ser aplicada nos mais diversos aspectos de nossa vida.

Resumindo, o fácil ou o difícil muitas vezes não é um problema conosco, uma limitação, e sim uma indicação de nosso preparo para lidar com determinadas situações. O difícil é um ponto final. Está acabado. O preparo é um processo, um dia chegamos lá. Nunca diga que algo é difícil. Diga: ainda não tenho toda a informação ou capacitação necessária, ainda não estou suficientemente preparado (mas estarei um dia). Você vai ver a diferença.